Um blog dedicado aos livros, às relações internacionais e aos problemas do desenvolvimento econômico e social, com ênfase nas questões da inserção internacional do Brasil. Ver outros trabalhos meus no site pessoal: www.pralmeida.org.
quinta-feira, 5 de janeiro de 2006
117) Think again (6): os anti-globalizadores defendem "idéias", certo?
Hélas, errado mais uma vez. O que eles menos parecem exibir são idéias...
Não que não existam propostas ou “idéias” a respeito da globalização, ou sobre como ela poderia ser mais humana, solidária, economicamente eqüitativa, socialmente justa e ecologicamente responsável.
Mas é que, em minha análise, as propostas ou alternativas à globalização apresentadas pelos anti me parecem desumanas, muito pouco solidárias, economicamente desastrosas, socialmente catastróficas e ecologicamente poéticas, mas insustentáveis no plano prático.
Talvez eu esteja sendo apressado demais, ao condenar as alternativas antiglobalizadoras, mas esta é a sensação que me deixou a leitura de praticamente todos os documentos do site www.forumsocialmundial.org.br.
Para ser honesto, comigo mesmo e com os representantes da anti, existe sim uma condição geral para que essa globalização deixe de ser tudo aquilo que ela aparenta ser, aos olhos dos anti: que ela deixe de ser capitalista.
Isto, pelo menos, é o que eu deduzo do 11º princípio da Carta de Princípios, que define o fórum como sendo
“um movimento de idéias que estimula a reflexão, e a disseminação transparente dos resultados dessa reflexão, sobre os mecanismos e instrumentos da dominação do capital, sobre os meios e ações de resistência e superação dessa dominação, sobre as alternativas propostas para resolver os problemas de exclusão e desigualdade social que o processo de globalização capitalista, com suas dimensões racistas, sexistas e destruidoras do meio ambiente está criando, internacionalmente e no interior dos países”.
Em outros termos, se a dominação do capital fosse eliminada, metade (ou pelo menos grande parte) dos problemas da humanidade estaria resolvida.
Ou muito me engano, ou a reflexão não vem sendo muito estimulada nesses encontros, já que não consigo atinar como se pretende eliminar um dos mais poderosos fatores de produção criados com o processo civilizatório, desde a revolução agrícola: o capital (ou talvez mesmo desde o paleolítico inferior, uma vez que armas de pedra ou de madeira são uma forma de “capital”).
Seriam os anti-globalizadores astronautas?
São eles de outro planeta, ainda não tocado pelo modo de produção capitalista?
Acredito que não, o que nos deixaria uma única conclusão: eles são simplesmente anti-capitalistas, o que tampouco é consenso entre eles. Com efeito, muitos proclamam não ser contra o modo de produção capitalista, apenas pretendendo melhorar o seu funcionamento.
De fato, ao ler os documentos da “Biblioteca das Alternativas”, constatei que alguns ostentam um anti-capitalismo visceral, ao passo que outros são apenas levemente anti-capitalistas.
Seriam os anti-globalizadores marxistas, socialistas ou de alguma forma pessoas de esquerda?
Dificilmente, pois nada existe de mais anti-marxista e de anti-socialista do que o pensamento nacionalista, chauvinista ou contrário ao saudável internacionalismo proclamado pelo autor do Manifesto Comunista e d’O Capital.
Marx proclamava, antes de mais nada, as virtudes do capital enquanto redutor das diferenças entre sociedades, em suas diversas etapas de desenvolvimento: ele pretendia que o capital unificasse rapidamente as forças produtivas e as relações de produção nos cantos mais recuados do planeta para que o exército dos proletários pudesse, finalmente, não recusar o capitalismo, mas sim superá-lo a partir de seu acabamento enquanto modo de produção, cedendo lugar a uma etapa superior de organização social da produção.
Mas isto eu não preciso relembrar, pois que constitui o “beabá” de qualquer marxista digno desse nome.
O que me surpreende, apenas e tão somente, é que, ao constatar a presença de vários “marmanjos” marxistas no movimento – com isso eu quero me referir aos mais velhos, que ainda leram Marx, já que os mais novos parecem simplesmente ignorar as obras do velho barbudo –, eles não tenham atinado para a existência dessa “contradição insuperável” em seu seio:
um marxista conseqüente deveria estar lutando em favor de mais, não de menos, globalização, pois apenas ela é capaz de trazer para mais perto de nós o dia da derrocada final do capitalismo e sua superação pelo socialismo.
A posição da anti-globalização não é, portanto, marxista ou sequer socialista.
O que de fato transparece nos muitos documentos compilados, como indicado no já citado 4º princípio, é um posicionamento dos anti contra o “processo de globalização comandado pelas grandes corporações multinacionais e pelos governos e instituições internacionais a serviço de seus interesses, com a cumplicidade de governos nacionais”.
Ou seja, o mal absoluto são as grandes empresas multinacionais, e quem não se posicionar contra elas fica proibido, portanto, de freqüentar os encontros do movimento.
No longo prazo, esse posicionamento pode representar uma contradição nos termos, na medida em que o movimento anti-globalizador já se transformou, de fato, em uma grande corporação multinacional, com representação em quase todos os países e com várias “instituições internacionais a serviço de seus interesses”.
Assim, se ele, por acaso, numa hipótese não de todo irrealizável, conquistar governos – como parece que já conseguiu convencer alguns e dispõe de muitos aliados em outros, inclusive perto de nós –, ele se tornará uma força irresistível, capaz de mudar de verdade a face do planeta.
Apenas não sei se para melhor, como uma análise de algumas de suas propostas alternativas pode demonstrar.
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