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quarta-feira, 4 de janeiro de 2006

111) Think Again (2): Alter-mundialismo?


Se posicionar contra ou a favor de coisas em geral, sejam elas idéias, processos, movimentos, pessoas ou princípios, dá um pouco mais de trabalho do que simplesmente ser acomodado, passivo ou mesmo indiferente. Decidindo ser contra ou a favor de algo, o dono da posição tem, em geral, de se justificar perante outros, explicar os motivos de sua postura, defendê-la de ataques ou contestações que possa julgar equivocados, enfim, fazer qualquer coisa que torne suas idéias não apenas “melhores” do que outras, que são concorrentes ou alternativas, mas também compatíveis com os princípios pelos quais ele afirma pautar sua vida, sob risco, em não o fazendo, de ser acusado de inconseqüente ou, simplesmente, de contraditório.
Ser contra ou a favor de um conjunto de idéias dá, portanto, um certo trabalho, pois que em geral se é obrigado a deixar a acomodação monótona dos slogans rápidos ou o simplismo redutor das idées reçues – isto é, as velhas crenças, sem fundamentação empírica ou validade prática – para pesquisar sobre os fundamentos das posições que se está defendendo, investigar suas causas e conseqüências, examinar a validade dos argumentos em favor de posições opostas – do contrário como seria possível recusá-las, tão simplesmente? –, bem como destrinchar as “fortalezas” de suas próprias posições e tornar evidentes as “fragilidades” das idéias alternativas.
Isso parece complicado e trabalhoso demais? Seria preferível, talvez, a placidez de algum consenso geral? Isso não existe: concordância de opiniões não é uma realidade muito presente nas sociedades democráticas, sobretudo em relação a fenômenos ou processos que são inerentes à própria dinâmica social na qual se vive, como é o caso da globalização. É assim inevitável que sobre ela persistam tantos debates e tanta polêmica.

Pense bem: os assim chamados alter-mundialistas -- que também recebem o nome de anti-globalizadores”, embora eles sejam o contrário disso – são efetivamente a favor do progresso social e da prosperidade dos países em desenvolvimento? Não creio, mas o debate corre o risco de ser um pouco longo e enfadonho.
Pretendo abrir um debate – que, pelo que sei, não terá resposta do outro lado – sobre um dos mais curiosos e surpreendentes fenômenos destes tempos de globalização e que conforma, ao mesmo tempo, um paradoxo: o fato de pessoas medianamente inteligentes – posto que, todas, da classe média para cima –, ou mesmo de indivíduos tidos como de inteligência superior – já que ostentando títulos universitários, livros publicados, espaços na imprensa, homenagens recebidas, enfim, credenciais reconhecidas pela mídia – se posicionarem de forma veementemente contrária ao processo de globalização (refiro-me, obviamente a “esta” globalização, que eles costumam chamar de “capitalista”).
A curiosidade está em que, contra tantos argumentos contrários às suas posições, eles façam sucesso, e o paradoxo (ou a ironia) é que esse sucesso se deve inteiramente ao processo de globalização, que eles condenam com tanta veemência.
Com efeito, não há fenômeno mais disseminado, mediatizado e de maior sucesso público nos últimos anos do que o chamado alter-mundialismo, também chamado de anti-globalização, termo que prefiro e já explico por quê. O alter-mundialismo, como ele mesmo se proclama, é um movimento que defende que um outro mundo é possível, ou seja, um mundo diferente do atual, talvez oposto, ou em todo caso melhor do que o que agora temos: injusto, desigual, contraditório, cheio de misérias e tragédias, feito de exploração do homem pelo homem, de dominação política, de guerras imperialistas, mas também de guerras civis, guerras tribais, limpezas étnicas, degradação da natureza, esgotamento de recursos, bref, um mundo horrível, capitalista e desigual, que caberia eliminar, ou pelo menos substituir por outro melhor. Mas é um fato, também, que o mundo está sempre mudando: já não temos tantas guerras como antigamente, menos pessoas morrem de fome ou doenças, hoje temos penicilina, saneamento básico, um pouco mais de direito e, certamente, mais justiça e democracia também. Enfim, o mundo mudou, embora talvez não no ritmo e na extensão que seriam desejáveis, mas ele mudou, e para melhor, nos últimos dois ou três séculos de revolução industrial e de globalização capitalista (usemos este adjetivo que incomoda muita gente, mas que expressa a realidade que os altermundialistas querem recusar).
Se o mundo mudou, e continua mudando a cada dia, a caracterização usada pelos altermundialistas é, no mínimo, tautológica, ou redundante, motivo pelo qual devemos recusar esse conceito. Mas, há um motivo a mais pelo qual esse conceito é inoperante, pouco prático e no mínimo carente de significado. É porque ele promete coisas que é incapaz de entregar, ou seja, a própria definição prometida em sua caracterização enquanto grupo. Se esse movimento é a favor de um outro mundo, que já indica ser possível sem qualquer tipo de demonstração positiva, ele deveria dizer, de imediato, qual é, como se organiza, quais são os fundamentos materiais, espirituais, arquitetônicos e conceituais desse outro mundo que seus proponentes proclamam de modo contínuo na internet e nos encontros ruidosos nos quais eles martelam um pouco mais a idéia, sem desenvolvê-la de fato. Portanto, o conceito não nos serve, até que ele venha recheado de algo mais e, por isso, estou jogando-o na lata de lixo da história.

(À suivre…)

Paulo Roberto de Almeida
Brasília (1523), 4 de janeiro de 2006

Um comentário:

Sérgio Antônio Canedo disse...

No diálogo platônico A República, Sócrates debate com Trasímaco, o sofista, o que seria Justiça. Trasimâco, com a praticidade dos sofistas responde: É a lei do mais forte! Ao que Sócrates retruca que ele havia pedido o conceito de Justiça e não do seu contrário, de Injustiça. Trasímaco, então, tenta usar a ironia (ipso venena bibas...) contra Sócrates: então diga você, oh, grande mestre, o que é a Justiça? Sócrates diz que não sabe... o que ele sabe é que aquele conceito dado por Trasímaco não pode ser o verdadeiro... o fato de não se saber o que é o que quer que seja, não significa que tenhamos que aeitar, na marra, "o que tem pra hoje..." como se fosse o caminho, a verdade e a vida...
Não é o Sérgio quem fala, é a Maria do Espírito Santo.